Ano: 2017
“Movido a desafios”
Letícia Zuppi
Carmo Dalla Vecchia, com seus traços marcantes, voz segura e olhar penetrante, passa a impressão de ser um ator que chega e preenche o local onde está. Por trás da beleza, que lhe rendeu o título do Look of the Year em 1990 – quando ainda era modelo – está uma personalidade forte e muita irreverência.
Foi em 1994 que iniciou na Oficina de Atores da Globo. De lá pra cá tornou-se conhecido pelo público em trabalhos como Engraçadinha, Cobras & Lagartos, A Favorita, Cordel Encantado, Joia Rara, Amor Eterno Amor, Império e A Regra do Jogo, entre outros, além do filme Onde Andará Dulce Veiga?
Acostumado a mudar de visual e adaptar-se às imagens de seus tantos personagens, Carmo agora tem em sua carreira um novo desafio: o de envelhecer para dar vida a um simpático velhinho de 90 anos. A transformação acontece no musical “Forever Young”, considerada uma das mais lindas e engraçadas comédias musicais europeias.
A trama se passa em um palco de um teatro antigo que se tornou um retiro de artistas, onde seis grandes atores representam a si mesmos no futuro, em 2050, quando estão quase centenários. Eles aproveitam a ausência da enfermeira para revelar suas verdadeiras personalidades por meio do bom e velho rock ‘n’ roll e mostram que são eternamente jovens.
Escrita pelo suíço Erik Gedeon, a versão brasileira da peça traz, além de Carmo, Paula Capovilla, Vanessa Gerbelli, Claudio Galvan, Marya Bravo. Miguel Briamonte se apresenta ao piano e faz a direção musical. Carmo vive um ex-ator, viúvo, solitário e romântico. Adora rock ‘n’ roll, é divertido e tem um ótimo humor.
No espetáculo, os personagens se confundem com os próprios atores e os nomes também são os mesmos, ou seja, as interpretações são baseadas na “bagagem de vida” dos atores. “Na peça há uma parte de ficção e o que é nosso próprio, pois os personagens são reais. São as nossas referências misturadas com a história”, conta Carmo.
Para construir visualmente os personagens envelhecidos, a equipe do espetáculo tentou primeiramente o látex, mas o material irritava demais a pele dos atores e, em uma sequência de vários espetáculos, passou a ser muito prejudicial. A saída foi partir das marcas de expressão de cada ator e apenas enfatizá-las com a maquiagem. “Ela apenas realça nossas próprias marcas. Tivemos orientação profissional de como fazer isto e deu bastante certo”, conta Carmo.
Para Carmo Dalla Vecchia é um desafio estar em Forever Young, mas ao mesmo tempo o ator encarou a novidade com determinação e segurança, mesmo este sendo seu primeiro musical. “Nunca vivi esta experiência. Já tinha feito aula de canto, mas não tinha esta vivência e bagagem de musicais que o restante do elenco tem. Mas me senti abraçado pelos demais atores e acreditei que poderia fazer”, conta.
O maior desafio para o ator foi cantar em coro. “Pensei que o mais difícil seriam meus números solos, mas as vozes distribuídas no coro, onde cada ator entra com uma abertura de voz diferente, para mim foi o mais complicado no início”, lembra. Como o personagem de Carmo toca guitarra, o ator testou novamente seus limites ao buscar aulas do instrumento para melhor interpretar suas cenas com ele e surpreendeu a equipe. “Me senti desafiado e feliz. É bom ter metas e desafios que nos impulsionam a conquistar algo”, diz.
A interpretação de seu personagem velhinho na peça fez Carmo refletir sobre sua própria velhice. “O que imagino para mim é o que vejo com meu próprio personagem: quero estar vivo e atento a tudo o que está ao meu redor, continuar tendo sonhos e ambições. Cada vez mais penso a jovialidade como um estado de espírito. Existem muitos jovens que se portam como velhos e vice-versa”, diz.
Para dar vida ao idoso, um personagem que assim como os demais, canta no musical, Carmo teve que encontrar, juntamente com sua preparadora vocal, como fazer a voz falada de uma pessoa mais velha e como ela cantaria. “A voz falada sofre com as cordas vocais mais frouxas, características do idoso, pois assim como qualquer músculo, as cordas não têm mais a elasticidade e firmeza de quando somos jovens. Para compensar este fato, muita vezes o idoso tende a falar em um tom mais agudo. Por outro lado, quando o personagem canta, também não é igual a mim, que tenho 46 anos. Então foi preciso encontrar esta voz e trabalhá-la dentro da técnica vocal, para que eu como ator pudesse reproduzi-la com segurança, sem forçar”, conta.
Mas não apenas as vozes tiveram que ser adaptadas ao espetáculo, como também houve uma importante preparação corporal dos atores. “Tivemos uma orientação corporal no sentido de entender as limitações de um idoso e não cair no estereótipo”, contou Carmo. Dedicado a se descobrir da melhor maneira possível no espetáculo, Carmo ainda propôs-se a usar fraldas geriátricas durante alguns ensaios. “Fiz isto porque achei que assim poderia vivenciar melhor o que alguns idosos passam e incorporar a fralda ao personagem, mas acabei, por orientação da direção, não fazendo mais uso dela”, contou Carmo.
A velhice, para Carmo, nada mais é do que um período que reflete as escolhas e comportamentos de toda uma vida. “O que o idoso é, representa como ele viveu e encarou a vida, é o reflexo de seu histórico. Como você vive é o que irá determinar como você será na velhice. Hoje tenho uma outra visão sobre os idosos, sobre seu comportamento, gosto de saber de histórias de idosos que estão em plena atividade e já vi senhores que se parecem muito com o meu personagem em seu jeito de ser. Tenho um olhar muito mais atento ao idoso hoje”, diz.
Como mensagem final, vivendo este personagem tão desafiador, o que Carmo espera com Forever Young? “Espero sempre conseguir comunicar e emocionar, passar uma mensagem de alegria e reflexão. E sim, quero ver o teatro sempre lotado!”, conclui.
Fotos: Em Destaque Na Cidade e divulgação
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“Christiane Torloni: talento, simpatia e engajamento”
Letícia Zuppi
Christiane Torloni é uma atriz talentosa, que sabe cativar o público. Com seu sotaque carioca marcante e voz suave, já participou de grandes sucessos da TV, do cinema e do teatro.
Filha de atores, iniciou sua carreira em 1969 e, desde então, vem surpreendendo os telespectadores. Participou de Malu Mulher, Baila Comigo, Elas por Elas, Partido Alto e, em 1986, roubou a cena como a Jô, de A Gata Comeu. Depois vieram Selva de Pedra, Armação Ilimitada, A Viagem (interpretando a inesquecível Dinah), Cara e Coroa, Torre de Babel, Um Anjo Caiu do Céu e diversos outros folhetins. Em 2003 encantou o público como a protagonista Helena, de Mulheres Apaixonadas e participou ainda de América, Beleza Pura, Caminho das Índias, Ti Ti Ti, Fina Estampa, Alto Astral, Amazônia – de Galvez a Chico Mendes, entre outros.
No cinema brilhou em sucessos como O Beijo no Asfalto, Perfume de Gardênia, Onde Andará Dulce Veiga? e Chico Xavier, entre outros. No teatro emprestou seu talento para obras como Tio Vânia, Hamlet, Salomé, Paixão de Cristo: O Auto de Deus, Mulheres por um Fio e A Loba de Ray-Ban.
Em 2008 encabeçou o movimento Amazônia para Sempre, ao lado dos atores Victor Fasano e Juca de Oliveira, alertando a população sobre a devastação da Amazônia. O abaixo-assinado do movimento teve grande adesão de personalidades do meio artístico. Em suas aparições públicas, Christiane sempre manisfesta o seu engajamento em Defesa da Floresta Amazônica. Produziu o documentário Amazônia: da Cidadania à Florestania, O Despertar e participou do Fórum Ambiental do Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental. Uma atriz determinada e consciente de seu papel na sociedade.
O mais recente desafio da carreira de Christiane Torloni é o espetáculo teatral Master Class. Na peça, a atriz dá vida à famosa cantora de ópera Maria Callas.
Master Class é uma comédia-dramática escrita pelo premiado autor norte americano Terrence MacNally, que chega ao Brasil e conta com a direção do encenador brasileiro José Possi Neto, sob a direção musical do Maestro Fábio G. Oliveira, ambos à frente de um grande elenco formado por consagrados atores/cantores do atual cenário teatral brasileiro. O espetáculo conta com as sopranos líricas Julianne Daud (Beijo da Mulher Aranha, New York, New York) e Bianca Tadini ( Evita, O Rei e Eu, West Side Story), o tenor Leandro Lacava (Avenida Q, Meu Amigo Charlie Brown), o ator e pianista Thiago Rodrigues, além dos cantores Thiago Soares e Jayana Gomes Paiva.
Christiane nos deu a honra de uma entrevista exclusiva para o site, falando sobre este novo trabalho. Confira:
Como é o desafio de interpretar um ícone como Maria Callas?
O processo de interpretação da Callas é o desdobramento de um grande processo de pesquisa que o José Possi e eu estamos fazendo há mais de 30 anos. Teve um momento, há mais ou menos 15 anos atrás que nós nos debruçamos na Callas. É muito incrível porque quando você se aproxima da Callas, a história dessa mulher é uma história de superação, desde o nascimento dela, pois ela foi recusada pela mãe nos primeiros dias. Então, esse é um espetáculo para você se apoiar em alguém que, mais do que tudo, não desistiu do seu belo.
Como você lida com as possíveis comparações com a interpretação feita por Marília Pêra, que estrelou o espetáculo em 1996?
A Marília é um divisor de águas – “antes de Marilia e depois de Marilia” – rsrsrs. O que que eu como artista posso acrescentar ainda a essa informação artística que foi passada? É interessante porque a Marilia é filha da arte assim como eu, que sou filha de atores – Monah Delacy e Geraldo Mateus. E foi pela mão da Marilia que eu fiz meu primeiro espetáculo – “As Preciosas Ridículas”, dirigido por ela, no Teatro Alasca, no Rio de Janeiro.
Como se prepara antes de entrar em cena para um espetáculo como “Master Class”?
Faço preparo corporal e vocal junto com o elenco. Gosto de me concentrar no meu camarim, rezar…
Em recente entrevista ao Programa do Jô, você comentou que vem vivenciando novas experiências, graças ao elenco de cantores sopranos que está em cena no espetáculo e lhe surpreendeu a sua disciplina. Como tem sido?
Tem sido maravilhoso trabalhar com eles. Os cantores líricos são muito disciplinados e disciplina é fundamental na construção de uma carreira. Não se constrói uma carreira, seja ela qual, for sem disciplina.
Segundo alguns atores, o personagem que se está interpretando no momento é sempre o mais importante. Porém, falando de televisão, há algum que você interpretou que tenha lhe marcado mais?
Sempre tive o privilégio de interpretar personagens que ficaram na memória do público. Dessa forma, todos me marcaram, cada um a seu tempo.
Que mensagem você espera que o público leve consigo ao deixar o teatro após “Master Class”?
Lendo os livros das aulas da Callas na Julliard School, você vê que ela humaniza tudo o que ela diz. Apesar dela ter se transformado em “La Divina” ela aponta que só há um caminho para a chamada perfeição – é a humanidade.
Fotos: Clariana Zanutto e Marcos Mesquita
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Ano: 2015
“Nicette Bruno: força e fé”
Letícia Zuppi
Nicette Bruno poderia ter seu nome traduzido em “simpatia”. A atriz, que acaba de completar 82 anos, está mais ativa e admirável do que nunca.
Grande conhecida do público por atuar em novelas desde a TV Excelsior e TV Tupi, a atriz participou de folhetins de sucesso como A Muralha, O Meu Pé de Laranja Lima, Sétimo Sentido, Louco Amor, Selva de Pedra, Bebê a Bordo, Rainha da Sucata, Mulheres de Areia, A Próxima Vítima, Sete Pecados, Ti Ti Ti, Salve Jorge e Jóia Rara. No seriado Sítio do Picapau Amarelo viveu a querida personagem Dona Benta, de 2001 a 2004.
O encontro com o também ator Paulo Goulart – falecido em 2014, com quem formou um dos casais mais queridos da televisão brasileira – aconteceu em 1952, quando ambos participavam da peça Senhorita Minha Mãe. Em 1954 casaram-se no palco do teatro e são pais de Beth Goulart, Bárbara Bruno e Paulo Goulart Filho.
Nicette conta que sua carreira sempre caminhou entrelaçada com a sua vida pessoal, de forma que sua trajetória artística no palco, confunde-se com momentos especiais de sua vida. “No teatro estreei com 14 anos no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. No palco me casei, vi o crescimento dos meus filhos e o início de suas carreiras”, lembra.
Após a morte de Paulo Goulart, Nicette Bruno decidiu homenagear o marido com o espetáculo Perdas e Ganhos, de Lya Luft, adaptado e dirigido por Beth Goulart. Para Nicette, o monólogo é uma forma de seguir e repensar esta nova fase de sua vida, sem Paulo. “No começo foi muito difícil, depois me ajudou muito, como um fortalecimento. Me trouxe coragem, força e reflexão”, conta.
A longa trajetória de carreira e nos palcos não faz com que Nicette deixe de lado seus estudos para levar ao público sempre um ótimo resultado em seu trabalho. Para encenar um monólogo, a atriz exercita-se e toma alguns cuidados. “Antes de entrar em cena, faço preparação vocal e física para não me cansar e para tudo fluir de forma mais harmônica”, conta.
Nicette dedica-se a rever o texto do espetáculo todas a vezes antes de entrar no palco. “Todos os dias repasso o texto e penso sobre ele”, conta. Como em qualquer peça de teatro, o “branco” – momento em que o ator esquece-se de suas falas – pode acontecer e Nicette já está também preparada para isso. Com seu bom entendimento e domínio do texto, consegue fazer uma rápida substituição de palavras. “Me beneficio dos meus 67 anos de carreira. Durante a peça é preciso muito concentração. Se esqueço alguma frase do texto, coloco rapidamente um sinônimo no lugar”, conta.
A reação do público também pode desconcentrar o ator durante um espetáculo. Principalmente em uma estreia de peça com importante significado para o artista. “Quando estreei Perdas e Ganhos, assim que entrei no palco fui muito aplaudida. Eu não esperava aquela reação da plateia e disse ‘obrigada’. Com isso me desconcentrei totalmente do texto”, revela Nicette.
Tal reação do público foi motivada como uma homenagem a Nicette, por sua força diante da perda de Paulo Goulart e pela decisão de homenageá-lo com a montagem. E as qualidades do marido inspiram Nicette a continuar. “Paulo era positivo, alegre e bem-humorado”, lembra.
Em uma nova fase de vida, Nicette Bruno revela que soube aceitar o destino com sabedoria. “Existem muitas perdas na vida, o importante é encarar com aprendizado”. E completa: “Não perco a esperança de novos momentos e novas realizações. Tenho muita fé e oro muito. Vou continuar a minha trajetória até o nosso reencontro”, finaliza.
Fotos: Em Destaque Na Cidade
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“Um galã cheio de charme”
Letícia Zuppi
Ricardo Tozzi era um executivo de sucesso até decidir largar a profissão para seguir a carreira de ator. O simpático galã campineiro apaixonou-se pelo teatro e, tempos depois, teve a oportunidade de estrelar na TV em novelas. Seu primeiro trabalho foi na novela Bang Bang, em 2005. Tozzi também esteve em Pé na Jaca, Malhação, Caminho das Índias, Insensato Coração e Dercy de Verdade, entre outros. Em Cheias de Charme interpretou os gêmeos Inácio e Fabian.
O começo da carreira no teatro ensinou a Ricardo que até mesmo o texto coloquial e as situações corriqueiras de uma obra devem ser trabalhados com cuidado e com atenção pelo ator, embora imagine-se que não se tenha dificuldades com textos assim. “Quando comecei no teatro fiquei muito à vontade. Durante uma peça errei uma palavra que parecia sem importância, mas logo fiquei preocupado com aquilo, me distraí e acabei errando todo o resto. Tomo muito cuidado pois sou um pouco disperso”, conta.
Estar no palco para Ricardo é uma experiência que hoje ele encara com muita sabedoria e que considera única. “Tenho muito respeito por estar no palco. Há uma coisa espiritual sobre estar lá”, diz.
Tozzi relembra com carinho seus personagens. Um deles foi o caipira Cândido, da novela Pé na Jaca, que lhe ensinou a rever conceitos de humor e drama. “Meu personagem tinha uma vida horrível. Ele não tinha estudo e nem perspectivas, mas era engraçado justamente devido à esta angustia, à este desespero”, conta.
Para Ricardo, no teatro ou na TV, a história de um personagem cômico tem uma graça que se origina da seriedade. “O humor não existe somente pelo humor, ele parte da verdade da tragédia”, diz.
E o humor é uma parte marcante do trabalho de Ricardo Tozzi, que roubou a cena como o atrapalhado suburbano Douglas, em Insensato Coração. Segundo o ator, os espectadores se identificam com personagens que levam o humor, justamente por esta ser uma necessidade atual. “As pessoas precisam de humor para lidar com suas vidas. A realidade é trágica, nos telejornais 95% das notícias são pesadas. O núcleo cômico das novelas é o que mais faz sucesso”, coloca.
Para o ator, interpretar um personagem engraçado é mais trabalhoso do que um tipo dramático. “O humor é mais difícil do que o drama. Já fiz os dois. O ator de humor tem que ter inteligência de vida, tem que ter a mesma visão do autor do texto”, diz.
Além de trazer diversão para o público, Tozzi acredita que, no teatro, os personagens engraçados podem levar o espectador a uma reflexão interior sobre sua própria vida. “O humor causa uma identificação e, ao identificar-se, você ri. Isso pode até ser inconsciente. O humor pode aliviar bullyings, mostrar um personagem que deu a volta por cima, passar um exemplo de vida. Por outro lado o drama também tem a sua função, de liberar a mágoa”, coloca.
Provocando na plateia diversas reações, um bom texto de teatro também enfrenta um obstáculo: o de não ser compreendido por alguns espectadores. Para Ricardo, é preciso sempre pensar se a obra a ser encenada está de acordo com o público a que se destina. “Muitas peças não são compreendidas. Às vezes o texto é muito sofisticado e não faz parte do cotidiano daqueles espectadores. Muitas pessoas também vão ao teatro pelo artista, porque o conhecem das novelas. É preciso avaliar o impacto que o texto terá naquele público”, diz.
Outra questão com a qual se deve lidar durante um espetáculo é a resposta do público à peça que, pode tanto ser variável, como nem existir. “A plateia é viva e você precisa saber contornar se a plateia não responde, não se manifesta”, diz.
Entrar em cena no teatro, na televisão e no cinema têm seus diferenciais. Segundo Ricardo Tozzi, no teatro há mais tempo para pensar o personagem em seus mínimos detalhes para cada cena. “No teatro até mesmo um gesto é pensado. Você tem meses para ensaiar as várias possibilidades. Na TV não, é tudo na hora. É preciso ter rapidez de raciocínio”, coloca.
Outro contraponto é que na TV – devido à quantidade de cenas gravadas em um único dia – não se tem muito tempo para preparar-se para dar vida as grandes emoções do personagem. “Na TV a concentração é primordial. Você tem que abstrair-se do contexto e se preparar rapidamente para fazer uma cena dramática pesada”, diz.
Interpretar um personagem no teatro e outro na TV ao mesmo tempo requer do ator uma grande dedicação. Ricardo conta que se dedica aos dois tipos de atuação apenas separadamente. “Fica inviável fazer novela junto com o teatro. Algumas emissoras já não permitem mais isso. Mesmo os trabalhos sendo na mesma cidade, há muito trânsito e o ator pode atrasar-se para uma gravação, por exemplo”, conta.
Um eterno apaixonado pela profissão que escolheu seguir para o resto da vida, Ricardo Tozzi relembra que seu trabalho nunca cairá na rotina, sempre com muitas possibilidades de estar em cena e em contato com os espectadores. “Há tantas formas de fazer a mesma coisa! Esta arte é a busca pela melhor forma e ela sempre tem o poder de convencer o público”, encerra.
“Ao público, com amor”
Letícia Zuppi
Adriana Calcanhotto vem conquistando o público desde o seu primeiro disco, Enguiço, lançado em 1990. Responsável por encantar as plateias com canções como Mentiras, Metade, E o Mundo Não se Acabou, Senhas, Esquadros, Inverno, Vambora, Mais Feliz, Devolva-Me, Maresia, Medo de Amar, Água Perrier e Cariocas, a artista já teve que ficar longe de seu violão por conta de lesões nas mãos.
Como até mesmo as dificuldades têm o seu lado bom, a cantora e compositora, em sua recuperação, foi indicada a trabalhar com pestanas – acordes de violão e guitarra em que se pressiona as cordas na mesma casa, com o dedo indicador – e, assim, compôs novas músicas com acordes deste tipo.
No momento de compor, Adriana revela que sua inspiração principal para novas canções vem da própria vida e que não precisa de uma disciplina ou de um local especifico para deixar a sua imaginação fluir. “Os métodos são aprisionantes, quanto mais se precisa das coisas ideais, pior. Componho em casa, na estrada…me sinto mais solta hoje”, conta.
Dentro de um repertório variado, as músicas de Adriana Calcanhotto falam sobre o amor, relações, entre outros temas que agradam o público. “As canções mais conhecidas são as românticas, que foram para as trilhas sonoras das novelas”, conta. Adriana explica a identificação de seu público com músicas deste tipo. “Toda música que fala de amor é muito direta, as pessoas aplaudem como se conhecessem”, diz.
Para a cantora, toda canção reflete um pouco do compositor, mesmo em se tratando de situações que ele não tenha vivido. “Não existe canção separada do autor. É tudo misturado, ficção com realidade. As minhas refletem a minha vida”, coloca.
Acostumada a levar ao público shows de qualidade, em que canções como Vambora, Esquadros, Inverno e Maresia não podem ficar de fora, Adriana conta que um tipo de show mais intimista lhe dá mais liberdade de execução e interação com a plateia. “Gosto dos shows solo. O show é sempre mais fechado quando há banda e deve-se seguir um roteiro. Porém só com o violão é possível mais agilidade, essa coisa do ‘pé na estrada’”, diz.
O show com atmosfera íntima e aconchegante como o show solo, exige do cantor uma segurança de contar apenas com si próprio no palco, sem dividir a responsabilidade com a banda, bailarinos, etc. E Adriana tem familiaridade com este universo. “Fiz durante muito tempo shows com voz e violão. Estou acostumada com este formato”, diz.
Segundo Adriana, shows com banda exigem sempre um maior preparo do artista. “Estudei muito para não fazer feio com banda e aprendo muito com os músicos”, conta, em tom de humor. “Fazer somente voz e violão é menos arriscado, é algo mais ‘cara de pau’”, diz.
Em comparação com outras cantoras da MPB, a facilidade de locomoção do show solo de Adriana Calcanhotto impressiona algumas pessoas que trabalham com ela. “Pessoas da equipe estão acostumadas a trabalhar com a Marisa Monte, cujo show utiliza caminhões e containers”, explica.
Tendo passado por diversos locais com seus shows, Adriana destaca a importância de haver, nas cidades, teatros de qualidade, como o Theatro Municipal de Paulínia, onde já se apresentou com o show solo “Olhos de Onda”. “Os teatros estão difíceis no Brasil. Quando uma cidade tem um teatro, um espaço para formação de plateia, esta é uma cidade de sorte”, diz. Segundo a artista, os teatros municipais devem existir afastados de interesses de governo, como um bem para a população. “Os teatros devem se solidificar independentemente da vontade política, sendo que uma administração dê sequência ao que a outra já fez”, comenta.
Com relação ao estudo do canto – parte essencial do trabalho de qualquer cantor – Adriana revela que foi uma boa aluna durante um certo tempo, porém se sentia aprisionada pelas exigências vocais do professor. “Fiz canto lírico em Porto Alegre (onde nasceu) e estudei com um professor que atendia também outras cantoras, mas que era insaciável. Ele me proibiu de tomar café e eu me peguei uma vez no camarim tomando um café frio escondido (risos)”, conta. A partir de seu incômodo com as regras rígidas de cuidado vocal, Adriana decidiu não submeter-se mais a elas. “Passei a me preocupar menos com a voz e tudo ficou melhor”, completa.
Bastante presentes nos shows de Adriana Calcanhotto, os poemas musicados mostram esta outra faceta de trabalho da artista, dando um toque especial as palavras de diversos compositores. “Vejo o poder que os poemas têm. A música que toca o público pode ser direta, crua e até irônica, como o trabalho de Waly Salomão”, conta Adriana, fazendo referência ao poeta brasileiro – já falecido – com quem fez parcerias.
O talento de Adriana é acompanhado por fãs de todos os tipos. A surpresa da cantora foi perceber que as crianças também admiravam o seu trabalho. “Fui percebendo em shows em ginásios uma certa quantidade de crianças sentadas no chão em frente ao palco. Elas gostam da canção Mentiras, que fala ‘quero quebrar estas xícaras, já arranhei os seus discos´, elas criaram uma identificação com meu trabalho”, conta.
Focando este tipo de público, Adriana decidiu fazer um projeto paralelo, com o nome de Adriana Partimpim. A partir do primeiro álbum infantil da cantora – o Partimpim Um, lançado em 2004 – e o sétimo de sua carreira, seu público mirim se estabeleceu. “A partir deste trabalho ganhei mais fãs pequenos e também fãs da terceira idade”, revela. A Partimpim Um seguiram-se Partimpim Dois (2009) e Partimpim Tles (2012).
Com o passar dos anos, um bom cantor deve saber reinventar-se e trabalhar de forma que seu repertório mantenha o público interessado. Para tanto, Adriana diz atentar-se a outros cantores e não perder o frescor a casa show que realiza. “Presto atenção nos artistas que mantem o mesmo repertório e se reinventam, como Mick Jagger. É preciso, a cada apresentação, cantar como a primeira vez e jamais deixar cair no ‘piloto automático’”, finaliza.
“Dama da TV, rainha dos palcos”
Falar sobre Regina Duarte é se lembrar de personagens inesquecíveis como Viúva Porcina, Raquel Acioli, Maria do Carmo Pereira, Simone, Rosana, Malu, Helena, entre tantos outros que roubaram a cena em Roque Santeiro, Vale Tudo, Rainha da Sucata, Selva de Pedra, Malu Mulher, História de Amor, Por Amor, Páginas da Vida, Irmãos Coragem, Chiquinha Gonzaga, Desejos de Mulher, O Astro…
Regina nasceu em Franca-SP, mas residiu durante boa parte de sua infância e juventude em Campinas. Uma atriz de grande marco na televisão brasileira, cujo talento também foi aplaudido no cinema e no teatro, em obras como A Compadecida, Além da Paixão, A Megera Domada, Honra e Coração Bazar.
Responsável por interpretar tantos personagens, a atriz revela detalhes de seu trabalho, a partir da composição de cada mulher a quem dá vida na ficção.
Segundo Regina, o momento de traçar o perfil da personagem a ser interpretada é uma tarefa do ator facilitada pelo escritor. “O autor contribui com uma porcentagem enorme disso, no mínimo 50% do personagem. No caso de Dias Gomes, ele já me deu 95% da viúva Porcina. Para mim era só embarcar no texto e pronto”, conta Regina, lembrando-se da novela Roque Santeiro, exibida pela Globo, em que foi uma das protagonistas ao lado de Lima Duarte, o Sinhozinho Malta.
Segundo a atriz, fazer TV, cinema e teatro são atividades que requerem diferentes preocupações do ator, a começar pela sua postura corporal e expressões faciais. “Na TV foca-se mais o rosto e o plano da cintura para cima. No teatro sempre temos que lembrar que estamos sendo vistos de corpo inteiro. Na TV e no cinema há uma economia fisionômica e, no teatro, uma maior expansão”, coloca.
Segundo Regina, esta expansão do teatro requer que o ator perceba seu corpo como um fator importante de comunicação com a plateia. “O público deve perceber o que o meu corpo quer transmitir, mesmo que eu esteja de costas, ou de lado, onde na TV haveria uma câmera para capturar a minha expressão. Teatro é o público e ele deve acompanhar tudo o que está acontecendo”, diz.
Em seu momento de compor uma personagem, entre tantas de sucesso que já conhecemos, Regina confessa que pode se sentir inspirada de várias maneiras. “Meu processo é variável de personagem para personagem. Às vezes tudo tem início com uma roupa, uma palavra, uma ideia e, partir dali, elaboro o universo em torno”, conta.
A atriz considera que experiências educacionais e culturais do ator também contribuam para este back ground do artista. “Tive um bom ensino em Campinas, uma qualidade de formação, uma boa base cultural. Meus pais me davam livros, LPs e me faziam gostar de arte”, relembra.
Regina destaca que para o ator, ter o hábito de ler, não apenas obras técnicas de sua área, mas literatura em geral, é muito importante. “Sempre li e gostei de atores como Machado de Assis, que mergulham profundamente nos seus personagens, nos fazendo acreditar naquela estória. ‘Gabriela Cravo e Canela’, de Jorge Amado, me marcou muito, tanto que minha filha chama-se Gabriela. Fiquei apaixonada pela feminilidade da personagem”, lembra.
Segundo Regina, uma das contribuições da literatura é auxiliar no chamado subtexto do ator, que seriam as entrelinhas e a entender as emoções. “O autor coloca o texto e a ação interna é com o ator. Ele tem que investigar o que há por trás. Se um personagem diz ‘odeio vermelho’ e o autor não deu nenhuma explicação para isso, tenho que inventar algum motivo para ele não gostar desta cor, eu invento as minhas razões”, diz.
A imaginação e a criatividade do ator o auxiliam na criação destes dados extras para compor o personagem e estão ligados a vivência pessoal de cada artista e suas recordações. “Me lembro que meu pai contava que uma vez machucou gravemente o dedo em um pedaço de cana. Sempre que ele contava eu já imaginava o sangue, a dor, a cor vermelha. Eu poderia usar esta memória emotiva para explicar o drama do personagem que não gosta de vermelho, por exemplo”, diz.
Atualmente, segundo Regina, os atores se preocupam mais com sua aparência física do que antigamente e também criaram novos hábitos. “Hoje existe um culto à beleza. No meu tempo o ator não se preocupava em ser belo. Eu saía do ensaio e ia para a biblioteca, para a livraria e não para a praia ou academia”, conta. “Hoje há muitas pessoas lindas e de cabeça vazia”, completa.
Nos tempos antigos também a jornada do ator de teatro era maior, assim como a procura da plateia. “Antes os artistas ficavam em cartaz de terça a domingo, muitas vezes com duas sessões no sábado. Estamos perdendo plateia do teatro, mas a TV também está perdendo espectadores, estamos ligados mais às coisas eletrônicas”, diz.
Porém, Regina Duarte não se desanima frente a estas mudanças e diante da ampliação dos meios de comunicação e interação. “Sou Poliana, detesto reclamar. O que posso fazer é conversar com a plateia, divulgar o teatro, trazer mais pessoas. Muitas nunca foram ao teatro, sendo idosas ou mais jovens”, diz.
Por fim, a atriz anima-se em dizer que o teatro continuará sobrevivendo enquanto arte e trazendo muitas obras às plateias. “Acho que o teatro sempre terá seu espaço e seu público. Hoje não é mais como antes, com o Teatro de Arena ou o Teatro Oficina (companhias teatrais que reuniram grandes nomes dos palcos), mas temos que comemorar. São Paulo hoje tem mais de 100 peças em cartaz”, conclui.
Fotos: Em Destaque Na Cidade
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Ano: 2014
“Voz suave, talento marcante”
Letícia Zuppi
Denise Fraga começou na TV em 1987. De lá pra cá acumulou trabalhos de sucesso como TV Pirata, Barriga de Aluguel, Retrato Falado, Trair e Coçar é só Começar, Boleiros, O Auto da Compadecida, Cristina quer Casar, Por Trás do Pano, Norma, A Alma Boa de Setsuan, Sem Pensar e 3 Teresas.
A simplicidade é a marca principal desta atriz, que à primeira vista parece tão frágil e doce, porém sua desenvoltura no palco e diante das câmeras da TV e do cinema, deixa todos ainda mais perplexos com o seu talento.
Ver Denise Fraga falar sobre a sua profissão, seus desafios, sua percepção das obras que encena, é sempre prazeroso. Para a atriz, o ator é um importante instrumento de ligação entre um autor e a plateia. “Acho bacana nosso ofício de servir ao autor, como um porta voz daquela ideia. É preciso ter um frisson de ler uma coisa e querer interpretá-la. Parece uma urgência de contar aquilo aos outros, como uma fofoca”, brinca a atriz.
O processo de criação de um ator é parte importante da sua interpretação, onde ele transmite uma identidade para o personagem. Para Denise, o estilo desta fase de trabalho varia muito de ator para ator. “O processo de criação é de cada um. Eu preciso da ‘partitura’. Me dizem muito que sou engraçada. Eu não sou engraçada e sim o texto com o qual estou trabalhando. Posso criar um jeito engraçado para aquele momento, porém ele não pode atrapalhar com a minha graça a ideia que estou transmitindo. A ideia tem que chegar e quem dosa o holofote na medida certa para o que está dizendo é o ator”, explica.
Tendo conhecido, decorado e ensaiado o texto da obra a ser apresentada no palco, o ator deve sair da chamada “zona de conforto” e se permitir um mergulho mais profundo em sua arte. “O ator tem que se desdobrar para achar meios de surpreender. Fauzi Arap (ator, diretor e dramaturgo) me dizia: ‘viva, mergulhe, se aproprie’. Por mais que o texto fosse coloquial, ele não poderia ser simplesmente dito. Fauzi falava: ‘não me venha com estas conversinhas. Me surpreenda!'”, lembra Denise.
Surpreender é fundamental para que o ator consiga manter a conexão com o público e fazê-lo “embarcar” na estória apresentada. “O ator tem sempre que ter aquele magnetismo, é o responsável por aquele ‘vem comigo’. Não é fácil manter uma plateia interessada por cerca de duas horas”, lembra a atriz.
Denise destaca a magia do teatro, em que a plateia volta seu olhar e atenção para o ator passando uma mensagem no palco, compartilhando com ele deste momento único. “O poder de captura que um ator tem, imbuído de seu personagem, é incrível. Todos compactuam com aquela estória, é como um pacto”, coloca.
Quem pensa que fazer teatro é sempre poder contar com cenários robustos e belos figurinos para ajudar a contar um enredo, está enganado. Não apenas estes complementos não são necessários como, segundo Denise, a ausência desses aparatos mostram que, de fato, o teatro é a arte simples de comunicar. “Percebo cada vez mais o poder da palavra, do texto. O teatro é uma arte incrível porque existe com um, com dois, na sua estrutura mais básica. Este aqui e agora é mais importante do que qualquer cenário”, diz.
O abrir das cortinas é o momento em que o ator percebe finalmente a plateia, porém, segundo Denise, seu comportamento pode ser esboçado antes mesmo da peça começar. “Toda noite de espetáculo penso nesta rede de pessoas que se forma. Uma pessoa liga para a outra, combina de assistir a peça, marca o horário, uma busca a outra, isso para estarem todos ali naquela hora. É realmente um encontro”, afirma.
Lembrando-se do ‘abrir das cortinas’, Denise comenta sobre os momentos que antecedem o início de uma peça e como a plateia dos dias atuais tem um comportamento diferente da plateia de antigamente. “O momento do black out – quando todas as luzes do teatro se apagam para o começo do espetáculo – curiosamente hoje não existe mais completamente. O que vejo na plateia são um monte de luzinhas azuis, das pessoas desligando seus celulares ou conferindo se desligaram”, brinca. Bem humorada, a atriz ainda revela que não se irrita quando um aparelho toca no meio do espetáculo. “É desagradável, mas este susto é bom, tanto para os atores como para a plateia, porque pensamos ‘opa, onde estamos? Estamos aqui, será que estávamos sonhando’?”, diz.
Falando em tecnologias e formas de comunicação, Denise conta que não é muito adepta das redes sociais, embora as considere importantes. “Acho sensacional, hoje se fala para muitos, é um comportamento diferente. Atualmente contar algo para uma pessoa só é visto por aí como perda de tempo (risos). Cada vez vamos nos sentir mais agraciados por alguém nos narrar uma estória”, avalia, com bom humor. Por outro lado, estar sempre conectado é algo, segundo a atriz, nem sempre tão vantajoso. “Estamos cada vez mais ligados ao audiovisual e perdendo o mergulho no livro, por exemplo. Algumas redes sociais roubam o tempo de leitura das pessoas”, lembrou.
Já com o teatro, este universo particular onde emoções, personagens, atores e espectadores se encontram, não há porque se preocupar. “O teatro não irá morrer nunca!”, finaliza a atriz.
Fotos: Em Destaque Na Cidade
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Ano: 2014
“Entre tecidos, tesouras e manequins”
Por Letícia Zuppi
Aos 42 anos e com mais de duas décadas de carreira, o estilista Alexandre Herchcovitch tem suas criações presentes nas principais semanas de moda do Brasil e do mundo. Possui uma loja em São Paulo, uma no Rio, sua loja online e parcerias com várias marcas. Participou dos programas Brazil’s Next Top Model e Projeto Fashion e é diretor artístico do curso de Moda do Centro Universitário Senac.
Diante desta sólida trajetória de sucesso na Moda, torna-se difícil definir os momentos mais marcantes da sua carreira. Porém, Herchcovitch aponta os que considera os mais importantes, como quando resolveu se profissionalizar na área e criar sua marca. “Quando resolvi fazer Moda, quando tomei a decisão de cursar uma faculdade, este foi um momento essencial, assim como quando abri a marca que leva o meu nome e quando ocorreu a sua internacionalização. Meu trabalho no Senac também marcou o início de uma fase importante”, coloca.
Herchcovitch relembra o início de tudo, quando começou a prestar atenção nos trabalhos de costura que a mãe fazia para ela própria, participando de todo o processo de confecção. “Eu ia com ela comprar o tecido, via tirar as medidas, acompanhava fazer o molde, cortar o tecido. Fui pedindo para ela me ensinar”, conta.
Aos poucos Alexandre foi desenvolvendo a habilidade e logo tinha alguns clientes, que atendia na própria sala da casa da família. “Meu primeiro ateliê foi em casa mesmo e felizmente meus pais me apoiaram muito, o que nem sempre ocorre, pois a profissão de estilista passa para alguns uma imagem de futilidade”, explica.
Herchcovitch se formou em Moda em 1993, aos 22 anos, e no início de seu trabalho como estilista, sua preocupação inicial não foi criar um estilo definido ou mesmo uma marca própria. “Quando eu comecei não tinha muito repertório, era muito jovem. Eu não pensava em estilo, nem sabia o que era. Fui pensar nisso anos depois. Meu foco era a construção da roupa”, conta.
Com o passar do tempo o estilista observou que a profissão escolhida o impulsionava, naturalmente, para novos horizontes, como ter uma marca própria. “A construção da minha marca foi intuitiva, aos poucos. O consumidor foi aparecendo, se identificando e comprando. Simplesmente eu fazia e quem gostava comprava, me escolhia. E é assim até hoje”, diz.
Criação
Parte fundamental do trabalho de todo estilista, a ideia inicial ou a “criação”, pode ser realizada por este profissional somente ou com o auxílio de sua equipe. E Herchcovitch valoriza a contribuição de todos os que trabalham com ele. “Trabalhamos todos juntos, na mesma sala. As ideias surgem e todos as colocam. Pode acontecer de ser eleita como a melhor para um projeto uma ideia que não tenha sido minha e isso é absolutamente normal”, diz.
Definido o foco do novo trabalho ou coleção, seguem-se as fases posteriores, de igual importância para que o produto final seja o imaginado desde o início. E Herchcovitch participa de todas as fases. “Um bom estilista não é aquele que apenas cria, mas que domina a construção do que desenhou. A menor parte do meu tempo uso para desenhar, a maior parte é gasta para cuidar do resto da criação, o que é muito trabalhoso. É preciso dominar todo o projeto”, afirma.
Acompanhar tudo de perto faz com que novas ideias despontem e de onde menos se espera. Alexandre mantem contato com seus fornecedores a cada 6 meses, em busca de novidades. “Isso faz parte da pesquisa. Eu sempre posso ter novas ideias ao observar os materiais que chegam, sempre pode surgir alguma coisa inédita”, conta.
Ineditismo esse que Herchcovitch sabe que deve sempre trazer ao seu trabalho, por conta do próprio universo da Moda. Em seu desfile inverno 2014 o estilista fez uma parceria com a também estilista Martha Madeiros e, juntos, apresentaram 4 peças utilizando uma mistura de técnicas de renda feitas à mão. “Quando fala-se em inovação, pensa-se somente em tecidos, em novas tecnologias nesta área. Não sou contra isso, mas inovar para mim pode ser trazer novas ideias, temas e formas”, diz.
Coleções
Para chegar à uma nova coleção que atraia os olhares de todos na passarelas, o trabalho inicial do estilista, ou seja, o desenho propriamente dito, só se dá após um trabalho de pesquisa e discussão a respeito de alguns elementos. “Penso no tema, história da marca, cor, tecidos, mercado, nas vendas da última coleção e só então vou para o papel desenhar”, afirma Herchcovitch.
Em um mundo em que estilistas de vários cantos criam e produzem Moda, o reflexo da essência pessoal e ideias de cada um pode ser visto como uma impressão digital nas peças. “Tudo que se produz em moda é um reflexo do que recebemos durante a vida. Hoje a moda não vê mais a nacionalidade do estilista, as fronteiras estão caindo. O que importa é o trabalho dele. E sua bagagem cultural vai aparecer no produto final. É possível dosar isso, mas vai aparecer de uma forma ou de outra, assim como em qualquer profissão”, conta o estilista, que tem o símbolo da caveira como sua marca registrada. “Sempre gostei. Não há nada por trás disto, foi uma escolha puramente estética”, completa.
Ao contrário do rumo da moda nas décadas passadas, hoje criar e produzir até ver o resultado final nas araras ou na passarelas trilha um caminho bem diferente. “Hoje procura-se estilistas que estudaram e se profissionalizaram e não quem aprendeu o ofício com a mãe ou o pai. Parte das profissões ligadas à moda estão evoluindo e outras estão se perdendo. O que se vê é que a modelagem brasileira está melhorando, porém o parque industrial têxtil no país está estagnado”, coloca Herchcovitch.
Ao ser questionado sobre o boom no mundo da Moda – ou o interesse crescente de tantas pessoas pelo tema – em um momento em que se fala tanto sobre o que vestir, como se vestir, Alexandre coloca que a fase atual ligada a este segmento já estava em curso há algum tempo. “A meu ver o boom da moda já passou, se é que podemos chamar de boom, pois ele pressupõe um auge e uma queda posterior, um desinteresse pelo tema. E não houve isso. Hoje fale-se bastante sobre Moda, até por conta da sua profissionalização, em jornais, blogs, e os que de fato trazem um conteúdo relevante permanecem”, diz.
Fama
Com tanto talento e tendo alcançado tanto sucesso, Alexandre diz não querer, no entanto, ser visto como uma celebridade. “Não gosto muito de exposição. No Brasil confundem estilistas com pessoas muito famosas. Gosto de dar entrevistas para falar sobre o meu trabalho”, diz.
Celebridade ou não, o fato é que milhões de brasileiros hoje possuem algum item da marca Alexandre Herchcovitch em suas casas, devido a contratos de licenciamento para diversas empresas como C&A, Chilli Beans, BIC, Converse, Danúbio, Disney, Olympikus, Motorola, Tok Stok e Zêlo. “A empresa Alexandre Herchcovitch não quis ficar restrita a roupa. Os produtos licenciados têm o estilo da marca e, neles, função e design são pensados para caminhar juntos”, explica Herchcovitch.
Apesar de uma trajetória tão bem sucedida, Alexandre vê a inserção no mercado internacional como uma tarefa árdua. “Deve ser uma tarefa difícil. Todos os estilistas são criativos. A moda hoje não concorre mais com a moda somente. Eu já concorro com imóveis, viagens, celulares, enfim, tudo o que o outro pode comprar”, diz.
Com 2014 em curso, Herchcovitch conta seus planos para o futuro próximo. “Quero dar andamento ao que já existe, o que já é bastante coisa. Seguir com os desfiles, com a marca…não tenho grandes planos. Sou privilegiado porque sempre soube o que queria fazer e faço até hoje. Sinto-me realizado”, finaliza.
Fotos: Em Destaque Na Cidade e divulgação
Ano: 2013
“Arte em movimento”
Por Letícia Zuppi
Foi em março de 2003, em Porto Alegre, que tudo começou. Sapatos e bolsas de grife ganharam uma nova assinatura. O causador desta mudança é definido como um empreendedor, artista e sapateiro: o designer Jorge Bischoff.
Sua grife – hoje já uma franquia – é composta por 45 unidades em todo o país e no Uruguai. A comercialização dos produtos também acontece em 800 pontos de vendas multimarcas no Brasil e em mais 40 países.
Bom gosto, elegância e sofisticação sobressaem-se na sua arte em movimento. Acompanhando as tendências mundiais, os sapatos, sandálias, peep-toes, sapatilhas, bolsas, clutches e demais produtos da grife, são criados para atender as consumidoras mais exigentes.
Moda, arte, criatividade, inspiração. Confira a entrevista com Jorge Bischoff, falando sobre sua trajetória profissional, sua grife, seu diferencial e a expansão da marca:
Você adquiriu várias experiências a partir dos seus 12 anos de idade em sua área, até iniciar seu trabalho como criador. Como foi este processo?
Minha convivência com o universo do sapato começou bem antes dos 12 anos. Minha família já era deste ramo. Cresci em meio à estrutura da produção de calçados, andando pela fábrica, brincando com pedaços de couro. Intimamente, ainda sem saber, cultuando o desejo de realizar, através de produtos, os sonhos das mulheres. Aos 12 anos eu já trabalhava em uma fábrica, destino comum a quem nascia nesta região de profunda tradição calçadista. Mais tarde, atuei em outros setores da indústria, na administração e nas vendas até, de fato, dedicar-me ao desenvolvimento e estratégias de produtos.
De onde vem sua inspiração para a criação das coleções?
Levo uma vida muito intensa, ativa e aberta para o novo, para o mundo, para as pessoas e para seus desejos. Estou sempre viajando, revisando meus conceitos e referências e isso faz com que a criatividade esteja aguçada e receptiva. Na hora de desenvolver as criações busco inspiração no universo feminino, na própria elegância e sofisticação da nossa consumidora. É um público que valoriza o glamour, o luxo e o requinte, que são referências sempre presentes em meu trabalho. Também procuro refletir nos produtos JB a alegria e a criatividade tipicamente brasileiras.
A elegância seria a palavra-chave de suas coleções?
A grife Jorge Bischoff é reconhecida pelo traço essencialmente autoral. Ainda que as tendências globais apontem alguns caminhos, nossas criações sempre têm identidade própria, obtida através de uma leitura muito particular dessas influências. As linhas arrojadas e elegantes, a aplicação de metais e a combinação harmônica de diferentes materiais, cores e texturas são marcas registradas deste trabalho. É o que denominamos “Conceito Jorge Bischoff”. Queremos sofisticação e elegância. Depois vem a tendência da estação. Esse é o nosso diferencial.
Como a tecnologia aliada à tradição está presente no processo de manufatura dos sapatos?
Costumo dizer que um bom vinho não se faz em Milão, mas sim no interior da Itália. O mesmo ocorre com nossos produtos, que são produzidos na essência, no centro da mais importante cadeia calçadista internacional, mantendo esse princípio. Aliando a tradição com os mais modernos processos industriais nas nossas fábricas parceiras, alcançamos e mantemos o nosso padrão de acabamento e qualidade.
Como vem acontecendo a expansão da marca no exterior?
A marca Jorge Bischoff está presente em mais de 40 países, em todos os continentes, através de boutiques multimarcas e a expansão está acontecendo naturalmente, em razão do padrão internacional do nosso produto. O processo de internacionalização do conceito Jorge Bischoff, muito além de produtos, foi iniciado neste ano, com a abertura de uma loja em Montevidéu, no Uruguai. Lá, conseguimos apresentar todos os nossos diferenciais de produto, exposição, atendimento, etc…, todo conceito da grife. A rede de lojas exclusivas no Brasil deve fechar 2013 com 60 unidades. Hoje são 50 lojas e a 50ª é justamente a de Campinas, aberta no final do mês de agosto (Shopping Iguatemi).
Imagens: Divulgação